terça-feira, 4 de abril de 2023

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país. 2. O radicalismo político no Segundo Reinado.

Continuo hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista.  O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.

Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. 

A segunda abordagem do livro é mais sobre um tema do que um autor. São inúmeros os autores que foram protagonistas dos debates da década de 1860, ao longo do Segundo Império, um tempo de muito radicalismo político, como nos mostra o historiador da UFRJ, José Murilo de Carvalho, sobre o referido período. O título de seu texto é O radicalismo político no Segundo Reinado. Basicamente se discute a forma da monarquia, sem questionar a sua existência. O que se pleiteava era uma série de reformas a serem feitas sob o regime monárquico. O republicanismo veio posteriormente. A substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre também atingiu esse período, mas, jamais a estrutura fundiária brasileira.

Ao final do livro existe uma pequena bibliografia dos intérpretes analisados. Desse período, quatro são os mencionados: 1. Marquês de Paraná - Homero Hermeto Carneiro Leão (1801- MG - 1851 - RJ). Era formado em Direito pela Universidade de Coimbra; 2. Teófilo Benedito Otoni (1807 - MG - 1869 - RJ). Participou ativamente em diversos movimentos liberais; 3. José Inácio Silveira da Mota (1811 - GO - 1893 - RJ). Era formado pela Faculdade de Direito de São Paulo; 4. Aureliano Cândido Tavares Bastos (1839 - AL - França - Nice - 1893). Formado em direito com o curso iniciado em Recife e terminado em São Paulo). 

José Murilo de Carvalho aponta para o fim das rebeliões regionais como a causa para que novos temas pudessem ser pautados. O fim do tráfico (1850) e o absoluto domínio do Partido Conservador também entraram em cena. Começou a haver alternância entre os partidos da elite. Entre os liberais passam a existir cisões, que marcarão profundamente os debates no período. Os liberais arrebatam o protagonismo aos conservadores. Pedem-se reformas eleitorais, na polícia e no poder judiciário e a extinção da Guarda Nacional. A abolição da escravidão também começa a ser discutida. Os liberais passam a atuar mais organizadamente. Os debates ampliam seus horizontes para além das tribunas e da imprensa. Novos nomes ganham maior projeção: Teófilo Otoni, Saldanha Marinho, Zacarias de Góis e Vasconcelos e o memorável Castro Alves.

Enquanto a pauta liberal se afirmava ao se exaltarem as iniciativas individuais, sob a bandeira da liberdade econômica e a limitação das interferências do Estado na economia, também se discutia o fim do Poder Moderador, do Conselho de Estado e da vitaliciedade do Senado. E a pauta da escravidão necessariamente teria que ser discutida. Tudo foi abafado com o início da interminável Guerra do Paraguai (1864-1870). Os debates também atingiam a descentralização administrativa e os princípios de uma organização federativa. Carvalho até brinca, afirmando que havia uma proposta de "reformas de base", antecipadas em seu tempo.

Toda a estrutura política e jurídica da monarquia passou a ser objeto de acalorados debates. Inclusive as entranhas do Império, na questão da unidade entre a religião católica e o Império. A única coisa que não se discutia era o alicerce da economia brasileira, ancorada na estrutura fundiária do latifúndio. Só mais tarde se discutiria, mesmo sem resultados, a chamada "democratização da terra". Em suma, não se discutia a monarquia, mas sim, a forma como este poder era exercido. Como as reformas no exercício desse poder teimavam em não se concretizar, a própria Instituição passou a ser contestada com a ascensão dos ideais republicanos. Liberais e radicais passaram para o campo do republicanismo.

A centralidade do debate passa a ser entre a Monarquia e a República. Até a abolição passou a ser um tema menor. Ela veio, mesmo com a adesão dos latifundiários ao movimento republicano, fato que não passou despercebido ao olhar atento de Luís Gama, o temido abolicionista. O latifúndio perdeu a questão da abolição mas a estrutura fundiária brasileira passou longe de todos os acalorados debates desse agitado período que culminou com a abolição e com a república. República nada republicana, diga-se de passagem. Enquanto que a abolição necessitaria de um segundo tempo, que até hoje não se efetivou.

Deixo a resenha do trabalho anterior sobre o Visconde do Uruguai.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/04/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes.html


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