Quem me levou a este livro foi o
nome de Alexandre Dumas, somado a uma promoção da editora Jorge Zahar. Dumas é
mais conhecido pelos seus romances como Os
Três Mosqueteiros e O Conde de Monte
Cristo, mas praticamente não houve
um único tema sobre o qual ele não tenha escrito. Também a culinária e a
gastronomia fizeram parte de seus escritos e, diga-se de passagem, com que
propriedade. Fiquei imaginando como é que ele fazia as suas pesquisas.
O belo livro de Alexandre Dumas. É história, é gastronomia e, acima de tudo, muito humor.
O belo livro de Alexandre Dumas. É história, é gastronomia e, acima de tudo, muito humor.
Um dos hábitos que conservo dos
tempos de professor é o de sempre situar e datar os personagens ou os fatos a
serem estudados e a partir daí fazer uma contextualização da época. Assim tudo
fica mais fácil. Alexandre Dumas nasceu na França em 1802 e morreu em 1870.
Viveu, portanto, logo após o evento da Revolução Francesa e o advento de
Napoleão Bonaparte. Um tempo bem agitado.
A sua vida também era bem agitada e, seguramente, mereceria
a leitura de uma boa biografia. Viveu tempos de fartura e de penúria. Creio que
não é errado afirmar que levou uma boa vida de burguês, senão o tema da
gastronomia não o teria interessado a ponto de pesquisar e escrever sobre ela.
Já não sei, após a leitura do livro, se o hábito da boa mesa é algo inerente aos monges ou aos burgueses.
Na dúvida, digamos que é dos dois.
Dumas é muito mais conhecido pelos seus romances do que pelos seus livros de culinária.
Dumas é muito mais conhecido pelos seus romances do que pelos seus livros de culinária.
O livro, na verdade, são dois
livros. Observemos o título – Memórias
Gastronômicas – seguido de Pequena
História da Culinária. O tema mereceu ainda outro livro seu, o Grande Dicionário da Culinária. Creio
nem ser necessário dizer que a sua leitura é uma tarefa agradável, pois a
gastronomia implica em gente reunida e, gente reunida remete à alegria e ao
humor. Farei alguns destaques do livro das memórias. Em outro post falarei da
história.
A primeira passagem que destaco é
um lamento seu sobre a mercantilização de tudo, numa época de revoluções
burguesas. Assim os gourmands estão
desaparecendo mais depressa do os próprios poetas. Não há mais emoção, só
negócios. “Em nossos dias, ó profanação! Assistimos à venda no varejo das mais
célebres caves parisienses. Aqueles
mesmos que as haviam criado, preciosos empórios da alegria, da verve, do
espírito, em suma, do amor dos homens, eles próprios introduziram nas caves a figura do provador – triste
comensal que degusta os vinhos sem os beber, apenas para determinar o preço a
ser cobrado por eles”. A partir daí o lamento se intensifica:
Tem cara de bom gourmet. Alexandre Dumas 1802 -1870. Uma vida atribulada. Merece a leitura de uma boa biografia.
Tem cara de bom gourmet. Alexandre Dumas 1802 -1870. Uma vida atribulada. Merece a leitura de uma boa biografia.
“Simplesmente para obter
dinheiro, o proprietário mandava vender os bons vinhos – o licor divino
destinado aos amigos, aos poetas, às pessoas interessantes, às doces alegrias
do lar! Dinheiro para substituir sorrisos, amáveis olhares, esperanças quase
realizadas, lábios amorosos suavemente umedecidos!”. Acho que todos nós continuamos com o justificado
lamento de Dumas.
Anotei outra passagem de refinado
humor, envolvendo Luís XV e o período da Regência: “Ele (o príncipe) e sua
amante, filha do contratador Pléneuf, levaram quase um ano comendo o que
restava de dinheiro nos cofres da França; depois, quando acabou o dinheiro,
começaram a comer a própria França. Come-se muito, portanto, sob a regência do
príncipe, mas não se comeu bem”. Me parece bastante atual este humor.
Uma ilustração do livro. Boa comida sempre foi privilégio para poucos.
Uma ilustração do livro. Boa comida sempre foi privilégio para poucos.
E por falar em humor, num
enunciado sob o título de Medicina e
culinária, atribui-se à alimentação dos povos as diferentes fases da
medicina. Assim sob Luís XIV “engordava-se, e todas as doenças, afirmavam os
médicos, resultavam dos humores”. E a medicina mandava “sangrar, purgar, clysterum donare”. E sobre isso conta-se
que “Luís XIV purgava-se duas vezes por mês, o que lhe desobstruía ao mesmo
tempo o estômago e a cabeça, propiciando-lhe tão bom humor que era nos dias 15
e 30, na saída do water-closets, que
os solicitantes o esperavam com suas demandas. Essa medicina durou, bem ou mal
uma centena de anos”.
O livro das Memórias gastronômicas, da Zahar é seguido pela Pequena História da Culinária.
O livro das Memórias gastronômicas, da Zahar é seguido pela Pequena História da Culinária.
No capítulo sobre as saladas
existe outra constatação interessante sobre a engorda de bois. Quando eles
concorrem ao título de bois gordos eles são destinados a comer capim e a tomar
água. Como conclusão, nem a água e nem o verde devem ser bons para se efetuar
uma dieta.
Além de relatos acompanhados de
muito humor, também encontramos em meio as suas histórias algumas receitas que
mostram as preferências dos famosos desta época. Em suma é um livro muito
divertido. Eu volto a Alexandre Dumas com a sua pequena história da culinária.
Maravilhosa resenha do livro,estou pesquisando sobre Dumas,para realizar um seminário na faculdade de gastronomia,muito obrigado pelo texto
ResponderExcluirQue bacana Erivan. Este é o Alexandre Dumas pouco conhecido. Bom seminário. Agradeço a sua manifestação.
ExcluirEu quem agradeço pela sua pesquisa ,está sendo de muita utilidade,mesmo sendo publicada 8 anos atrás,não se tornou obsoleta e datada,muito pelo contrário,se manteve atual,revelando mais sobre esse Dumas,desconhecido por muitos!
ExcluirObrigado pela sua manifestação, Erivan.
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