terça-feira, 10 de março de 2015

A Memorável Greve da Educação - 2015.

Comecei tendo dificuldades para dar um título a este post, devido a sua abrangência. Se a greve se centrou na educação, envolvendo professores e funcionários, na verdade, ela envolveu todo o funcionalismo público. Por ter sido um governador irresponsável e perdulário, em dezembro, ainda no seu primeiro mandato, Carlos Alberto Richa enviou para a Assembleia Legislativa o seu pacote de maldades - para ser votado em regime de tratoraço - contra o povo paranaense em geral e contra o funcionalismo público em particular. Para todo mundo, aumento generalizado de impostos e para o funcionalismo, uma reforma na Previdência, assacando os velhinhos e impondo teto aos novos.
Muita violência e deputados no camburão. Teve de tudo nesse vitorioso e histórico movimento.

Não bastasse isso, para sanar os cofres do Estado, esvaziados pela irresponsabilidade de seu governo, um novo pacote de maldades, desta vez absolutamente inimagináveis e, de novo, sob o infame regime de tratoraço. Desta vez a mão pesada liquidaria o plano de carreira, eliminando a base, o chão deste plano, eliminaria quinquênios e anuênios, e a possibilidade de ascensões pela via do PDE e tentou, ainda, um assalto ao dinheiro de futuros aposentados, apropriando-se de seu fundo de Previdência. A sua sanha por gastos irresponsáveis fez com que quisesse se apropriar de um fundo de 8 bilhões de reais.
Na primeira ocupação da assembleia uma cena bem brasileira, de misticismo religioso.

Já na educação havia mais outras questões. Como secretário da Educação ele nomeou um gestor, com histórico do tempo das privatizações, munido de uma tesoura e com o receituário do Banco Mundial para a educação. Não importa que a qualidade da educação pública caia, desde que se faça economia, foi o bordão. Vamos instituir a racionalidade técnica nas escolas, cortando gastos, aglutinando turmas, eliminando atividades que levariam a escola para a educação em tempo integral e, eliminando pedagogos e funcionários. Havia ainda pendências da greve anterior, de promoções não efetuadas, do não pagamento do terço de férias e das rescisões contratuais dos funcionários PSS, demitidos. As aulas não começaram.

Em assembleia os educadores decidiram pela greve, que, na verdade, já tinha sido decretada no interior de cada escola. O governador Carlos Alberto conseguiu um feito inédito. No reinício das aulas, nenhuma escola funcionou. Houve a notícia de que uma única escola abrira os seus portões. (Soube-se depois que o seu diretor é filiado e militante do PSDB, o partido do perdulário governador). Montou-se um acampamento em frente ao Palácio e da Assembleia. Afinal de contas, o pacote teria que ser votado. E é nesse campo que estão as conquistas desta greve, que aliás, ocorreu, não para acrescentar dinheiro ou direitos, mas para não perdê-los. Esta história precisa ser bem contada.
Duas ocupações da Assembleia legislativa e deputados andando de camburão. Fim do tratoraço.

A primeira votação foi marcada para o dia dez de fevereiro. Uns trezentos professores estavam nas galerias e uma multidão em frente. Quando houve o anúncio de que o regime de votação conhecido como tratoraço fora aprovado, o povo ocupou (não se invade aquilo que nos pertence) todas as dependências da Assembleia e os das galerias ocuparam o Plenário. Os deputados ainda tentaram se reunir num refeitório improvisado como Plenário, mas percebendo não terem condições, encerraram a sessão. Foi a primeira grande vitória do movimento. Mas o pior ainda estava por vir, ou o melhor, dependendo do enfoque. A ocupação da Assembleia continuou. A votação do tratoraço dividiu os professores em amigos e inimigos da educação. Confira a relação:
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2015/02/os-deputados-amigos-e-inigos-dos.html

O perdulário governador não se deu por vencido. Exigiu nova votação, que foi marcada para o dia 12, de novo no refeitório improvisado como Plenário. A multidão em frente se transformou num mar de gente e a Assembleia foi cercada. Todas as entradas foram tomadas pelos manifestantes. Pela tarde, um palco de guerra se arma. Uma multidão de policiais, tropa de choque e cães amestrados contra a multidão armada de espírito de luta e algumas flores para serem oferecidas aos policiais. Um ônibus camburão se aproxima em meio a uma escolta policial nunca vista. No ônibus camburão estavam - vergonha suprema - os deputados inimigos da educação. Serraram-se grades e os deputados entraram na Assembleia e preparam-se para o início da sessão.
O histórico dia 12 de fevereiro. Tropa de choque, cães amestrados e bombas. Quase uma tragédia.

Um enorme temporal toma conta com forte chuva e trovoadas. As trovoadas foram engrossadas com o espoucar de bombas de gás lacrimogêneo, de pimenta e de efeito moral. Nunca vi coisa parecida. Nunca vi destemor maior por parte dos manifestantes. A Assembleia foi novamente ocupada pelos professores e, em meio a tudo isso houve uma ordem da suspensão da votação. A vitória foi inimaginável. O dia 12 de fevereiro entrará para a história política do Paraná. O governo fora posto na defensiva.  Por algumas frações de tempo não ocorreu ali, uma tragédia de dimensões inimagináveis. Nos dias seguintes, a cada dia, se contavam novidades sobre o ocorrido e que precisam ser contadas. Fatos pitorescos, inclusive.

Deputados amigos da educação pública. Prenúncio de vitórias. Nada foi votado no dia 12.

Soube-se depois que o Carlos Alberto exigiu a votação e encarregou o homem que prendeu o Abadia de arquitetar o plano. Comédia e tragédia se misturaram. Nunca deputados passaram tanto constrangimento, de andarem de camburão. A piada pronta exigia a sua condução para Piraquara. O pânico tomou conta do cortejo e aumentou nas proximidades da Assembleia. O ônibus foi sacudido, o valentão que prendeu o Abadia correu de um desarmado professor, enquanto uma das excelências não continha seus humores intestinais e, literalmente, se borrou nas calças e o chorume malcheiroso vazou. O nome da excelência que se borrou virou um pacto de juramento de morte. Destaco duas crônicas da Gazeta do Povo sobre o tema: O pacto malcheiroso de Dante Mendonça e a Crônica da viagem do ônibus do choque, do Rogério Galindo. Obras primas do humor político.
Assembleia da Vila Capanema. Mais de quinze mil educadores presentes. A greve continua.


Mais dois importantes fatos precisam ser mencionados. A passeata dos cinquenta mil e a assembleia do dia 4 de março. A passeata, realizada no dia 25 de fevereiro, teve dois pontos de saída. O interior saiu da praça Santos Andrade, enquanto que o pessoal de Curitiba se concentrou na praça Rui Barbosa. O encontro se deu na praça Tiradentes, chegando até o Palácio Iguaçu. A assembleia precisou de um estádio de futebol, o do Paraná Clube, para abrigar quase vinte mil participantes, que votaram pela continuidade da greve. A APP-Sindicato propôs uma mediação do judiciário, como solução do impasse. A mediação aconteceu, compromissos foram firmados e nova assembleia foi convocada para o dia 9 de março, de novo na Vila Capanema.
Assembleia na Vila Capanema, 4 de março. Mais um momento da votação. A greve continua.


Esta foi a maior greve de educadores já realizada na história do Paraná. Teve forte apoio popular e até setores da mídia paranaense  passaram a apoiar. Não, evidentemente, a comandada pelo Ratinho Jr., que se postou ao lado do perdulário governador, de quem é secretário. Saiu muito chamuscado entre os manifestantes e certamente comprometeu pretensões futuras suas. Mostrou a sua identidade. Da mesma forma os deputados do bancada do camburão encontrarão dificuldades em eleições futuras e até de se locomoverem em suas bases. Como foi uma greve de resistência e não de reivindicações, o governo foi praticamente obrigado a retroceder em todas as medidas do pacotaço de maldades. Recuou nos dois pontos mais importantes que eram os de destroçar o plano de carreira e por mão grande nos 8 bilhões de reais do Fundo de Previdência e a abolição da votação pelo famoso tratoraço.  Seus índices de popularidade chegaram a níveis tão baixos, como nunca um governador do Paraná havia atingido.
A frase eternamente verdadeira. "O governador pode muito - mas não pode tudo", dizia o deputado Tadeu Veneri.


Tudo foi muito bonito de se ver e todos os que efetivamente participaram deste fato histórico saem com a autoestima extremamente elevada. "Foi bonita festa pá! Fiquei contente. Ainda guardo renitente - um velho cravo para mim". A minha individualidade se transformou num coletivo, do tamanho do Paraná inteiro.
A documentação do fato. Eu estava lá. O meu cartão, entre milhares. A greve continua.

A assembleia do dia 9 de março marcou o fim deste histórico movimento. Compareceram em torno de sete mil grevistas. O alerta ficou ligado. O estado de greve continua. O governador está sob suspeita e carece de total falta de credibilidade. Aqui a austeridade, como nova forma de acumulação de capital, ao menos desta vez, não funcionou.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo comentário. Depois de moderado ele será liberado.