sábado, 7 de março de 2015

Chiquinha Gonzaga. A Pioneira na Luta pela Emancipação Feminina.

Estou lendo um interessantíssimo livro sobre sete personagens de nossa história do Brasil. Entre estes está Chiquinha Gonzaga (1847 - 1935). Chiquinha não costuma frequentar os livros oficiais de história do Brasil, embora isso devesse ser uma exigência e, assim muitos conheceriam a história de sua vida. Ela simplesmente foi a pioneira na luta pela emancipação feminina, em tempos em que isso era praticamente impossível, mas não para ela. Como gostei da sua história e como nós estamos nos aproximando do dia internacional da mulher, resolvi lhe dedicar este post.
Antes e Depois. Um dos personagens trabalhados neste livro é Chiquinha Gonzaga.


O livro em que a sua história está inserida é Antes e Depois - Um dia decisivo na vida de grandes brasileiros, quando pequenos. O livro é um lançamento da Companhia das Letrinhas. Literatura infantojuvenil, portanto. Mas que literatura! Tem muita qualidade. A autoria é de Flávio de Souza e tem ilustrações de Daniel Almeida. A história da compositora é escrita sob a forma de uma peça teatral, uma peça biográfica teatral.

Há pouco eu terminara de ler o livro da historiadora Mary del Priore, Histórias Íntimas - sexualidade e erotismo na história do Brasil. O livro não cita Chiquinha Gonzaga mas registra todas as dificuldades que as mulheres enfrentaram na luta pela causa da emancipação feminina. Vivia-se, aliás ainda se vive, uma cultura machista, absolutamente dominadora. A mulher teria que ser submissa ao homem e as mulheres que se separavam no casamento, teriam que viver praticamente confinadas, tal a rejeição social. Com Chiquinha Gonzaga tudo foi muito diferente.
A relação de Chiquinha Gonzaga com a música começou com um piano, que ganhou quando tinha 9 anos. Aos 11 já compunha. A ilustração do livro referente a Chiquinha Gonzaga.


A narrativa da peça teatral começa em 1935, o ano de sua morte, às vésperas do carnaval. Um mestre de cerimônia nos conta os primeiros anos de sua vida. É filha de pais não casados, o pai branco (militar) e mãe mulata. Aos 9 anos ganhou o seu primeiro piano e aos 11 fez a sua primeira composição. O seu personagem aparece em cena pouco antes de sua morte, aos 87 anos e anuncia: " Realizei quase todos os meus sonhos, desejos e anseios" e continua: "Sofri e chorei, porém também fui feliz e sorri. Dei passos gigantescos, abri algumas portas para nós, mulheres, e outras ainda deverão ser abertas por novas brasileiras que virão. Conheci meio mundo, criei quatro filhos, me sustentei com meia dúzia de profissões". Aí o mestre anuncia os seus principais feitos:

Primeira mulher a reger uma orquestra no Brasil; primeira mulher compositora de música popular no Brasil; autora da primeira composição musical feita especialmente para o carnaval; uma das primeiras mulheres a se separar de um marido que a traía - no caso dela - de dois maridos, para viver em liberdade, desdobrando-se para se sustentar. Foi mãe de quatro filhos e professora de piano, canto, português, francês, geografia e história e compositora de trilhas sonoras para peças de teatro musicais; foi pianista em cinemas e lojas e maestrina. Foi abolicionista na teoria e na prática, também vendia partituras próprias para arrecadar fundos para a campanha e comprar a liberdade de escravos. Foi ainda pioneira na luta pela arrecadação de direitos autorais.
A cantora e compositora Chiquinha Gonzaga e uma referência ao seu maxixe no Catete. Corta-jaca.


O Palácio do Catete também entrou em sua vida. Nair de Tefé, a primeira dama da República a convidou para se apresentar na festa de despedida do presidente Hermes da Fonseca. Na solenidade,  como não bastasse a sua figura profana, houve música popular, com instrumentos populares e um maxixe, o corta-jaca, para a indignação geral e em especial a de Rui Barbosa, em discurso no Senado: "A mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba. Mas nas recepções presidenciais o corta-jaca é executado com todas as honras de Wagner". Como podem ver, a nossa cultura tinha muito pouco de brasilidade.
A ilustração mostra a soma que se deu em Chiquinha Gonzaga. A mulher, o trabalho e a música.


Um de seus maiores sucessos foi a peça teatral Forrobodó, que a princípio ninguém queria patrocinar, mas que, após muita insistência, foi contratada para uma semana de apresentações e que, na verdade, terminou sendo apresentada mais de 1.500 vezes. Ela assistiu a peça, depois de uma tourné pela Europa, com o seu novo amor, o Joãozinho. O encontro com ele se deu, quando ela tinha 52 anos e ele 16. Isso se somou aos escândalos anteriores, como ter nascido numa família que só se casou após o seu nascimento e depois de ter despachado dois maridos que lhe foram infiéis. Com o Joãozinho ela viveu bem e feliz. A energia para as suas composições lhe vinha da pilha de contas a pagar todo mês.
Uma grande pioneira. Na luta pela emancipação da mulher, pela afirmação da música popular brasileira e pelo uso de instrumentos populares .


Chiquinha Gonzaga era uma personagem viva do seu tempo. Nunca se omitiu em nada. Ainda  lutou em favor da abolição e contra a monarquia, pela causa republicana. Foram 87 anos de vida, de desafios bem enfrentados. Se tivesse sido uma mulher comum, sequer saberíamos de sua existência. Ela foi uma mulher abre-alas, mas muitas alas ainda precisam ser abertas para que se dê passagem a um mundo de igualdade e sem preconceitos. Imaginem como seria o mundo se todos tivessem tido a coragem da grande pessoa humana que foi Chiquinha Gonzaga, uma personagem símbolo na luta pela emancipação feminina e pela igualdade e dignidade do ser humano.

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