segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Temas eleitorais. 5. Um modelo brasileiro de desenvolvimento?

Ouvi pela primeira vez referências a modelos de desenvolvimento com a leitura de Celso Furtado. Lembro que ele falava em capitalismo tardio. O Brasil é um desses países onde o capitalismo se desenvolveu muito tardiamente. Neste ano, lendo sobre os 50 anos da ditadura militar brasileira, me deparo com o livro, organizado por Daniel Aarão Reis, Marcelo Ridenti e Rodrigo Patto Sá Motta, A ditadura que mudou o Brasil. No primeiro capítulo deste livro, o próprio Daniel Aarão Reis analisa a cultura política nacional-estatista. A tese do autor é a de que este modelo é uma espécie de modelo próprio, de desenvolvimento brasileiro, caracterizado pela intervenção do Estado, exatamente em um país que tem as marcas de um capitalismo tardio, que precisa fazer frente à velocidade do livre mercado.
Neste livro encontramos o texto de Daniel Aarão Reis, A ditadura faz cinquenta anos: história e cultura política nacional-estatista.

A gênese desta cultura política nacional-estatista está no Estado-Novo de Getúlio, quando este enfatiza o declínio do individualismo e do liberalismo e afirma a nova fase de prevalência do Estado regulamentador. Como se vê, toda a movimentação da história do período das crises entre as guerras, se fará presente aqui no Brasil. O autor aplica a este modelo algumas marcas próprias, a saber: a) um Estado centralizado e integrador do nacional; b) um ideário nacionalista e unificador; c) o seu esteio nas forças armadas; d) a realização de amplas alianças sociais; e) uma concepção de modernização e de industrialização e f) se orientar por uma política externa de afirmação nacional.

Acima de tudo, pairava no horizonte, uma visão positiva do país como estado/Nação, superando todas as visões negativas, oriundas no clima e na mistura das raças, (as doutrinas da eugenia) que nos condenavam a um eterno inferno da dependência. Todas estas teorias começaram a ser superadas nesta época, embora muitos preconceitos permanecessem e estão enraizados em nossa cultura até hoje.

Esta cultura política nacional estatista se encravou em nossa história e foi a grande responsável pelos saltos de crescimento econômico, e, inclusive, social que tivemos. Esta cultura esteve presente no período do desenvolvimento auto-sustentado do modelo getulista, no desenvolvimento dependente, dos 50 anos de crescimento em cinco anos de governo, sob JK., nos anos de chumbo do milagre econômico, na ditadura militar, especialmente nos governos Médici e Geisel e, mais precisamente ainda, nos governos Lula e Dilma, em que funcionou o binômio do crescimento econômico com a distribuição de renda.
O pós neoliberalismo se afirma por um novo ciclo de intervenções do Estado em favor da cidadania, construída a partir dos espaços públicos.


Esta cultura política nacional estatista sempre teve o feroz combate da ortodoxia liberal. Mas quando esta ortodoxia dominava as forças políticas no poder, os desastres econômicos e sociais vinham na sua esteira. Assim, na própria ditadura militar, as tendências liberalizantes do governo Castelo Branco tiveram que ser abandonadas, com os custos políticos, que são de triste memória. O golpe dentro do golpe, em 1968. Nos anos 1980 e 1990, uma nova onda liberalizante, marcada pelo neoliberalismo e pela globalização se instalou no país, especialmente, sob o governo de Fernando Henrique Cardoso.

As consequências mais uma vez se fizeram sentir desastrosamente. Inflação acima dos dois dígitos (12,6%- no último ano de governo FHC), desemprego beirando os 20%, baixo índice de crescimento do PIB e três constrangedoras visitas ao Fundo Monetário Internacional foram feitas, sendo então aplicadas as políticas do Consenso de Washington. A memória política de - e sobre - o seu governo lhe confere uma imagem muito negativa.
Se as doutrinas do livre mercado geraram a seleção e, em consequência, a exclusão, as ações positivas do Estado passaram a ser responsáveis por políticas de inclusão social e de cidadania.


Em 2002, com a vitória de Lula, o modelo do livre mercado foi novamente substituído pelo modelo da cultura nacional estatista e um novo surto de crescimento econômico com distribuição de renda ficou estabelecido, com milhares de pessoas saindo da condição da miséria absoluta e outras tantas ascendendo ao fenômeno, bem ou mal designado, da nova classe média. Também se rompeu com a ditadura dos agentes econômicos internacionais. De devedor do FMI, passamos a ser seu credor.

Para encerrar e, como já estamos vivendo o período eleitoral, deixo uma frase de Friedman, que creio, ajuda a entender a situação de catástrofe - que a mídia tenta passar sobre a atual realidade da economia brasileira, com claros e evidentes objetivos eleitorais. "Só uma crise, real, ou percebida como tal, produz uma mudança verdadeira. Quando esta crise ocorre (ou assim for percebida) as ações empreendidas dependem das ideias vigentes. esta é, acredito, nossa função básica: desenvolver alternativas para as políticas existentes, mantê-las vivas e disponíveis até que o politicamente impossível se torne politicamente inevitável". Só lembrando, que Milton Friedman é o principal teórico das doutrinas neoliberais. Não podemos cair nesta cilada e, para isso, precisamos recorrer à história e à memória, mesmo que seja de fatos ainda recentes.


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