segunda-feira, 2 de maio de 2016

Encontro com Adolfo Pérez Esquivel. O Nobel da Paz.

Dia 29 de abril de 2016. No âmbito estadual,o primeiro aniversário do massacre dos professores e funcionários públicos, com intensos bombardeios de mais de duas horas de duração e com mais de duzentas pessoas feridas fisicamente, e milhares, simbolicamente. No âmbito nacional, um golpe de estado em curso, promovido pela mídia, pelo parlamento e pelo poder judiciário. No âmbito internacional, uma nova onda conservadora, desta vez mais voltada contra a América Latina e contra os direitos vinculados ao trabalho.
Adolfo Pérez Esquivel chegando ao salão nobre da Faculdade de Direito.


No espaço do prédio histórico da Universidade Federal do Paraná, que abriga a Faculdade de Direito, houve uma promoção organizada pelos advogados pró democracia e o ilustre convidado da noite era Adolfo Pérez Esquivel, um Prêmio Nobel da Paz, do ano de 1980. Esquivel foi agraciado com este título em função de sua intensa luta pelos direitos humanos dos menos favorecidos e pela luta por democracia, esta concebida como efetiva igualdade de oportunidades.

Adolfo Pérez Esquivel conta hoje com 86 anos de idade mas com um vigor dos tempos de juventude. É filho de imigrante italiano e mãe guarani. As atividades no Brasil foram intensas. Visita de apoio para a presidente Dilma, manifestação anti golpe no senado e a consequente irritação dos senadores golpistas, participação nos atos em memória do primeiro aniversário do massacre promovido pelo governador Beto Richa, no assalto institucional à previdência dos servidores públicos do estado e, ainda, o ato em defesa da democracia.
Muito feliz postado ao lado do Nobel, da luta por democracia e direitos iguais.


A sua fala esteve acompanhada de forte emoção. Esta emoção ocorreu em função das memórias de sua bela trajetória de vida, lembrada por seus apresentadores e pela música de um dos grandes violeiros brasileiros, Pereira da Viola, que além do Hino Nacional lhe homenageou com uma música de sua terra.

A sua fala esteve revestida de toda a autoridade de um Nobel da Paz. Começou agradecendo a música, sempre uma carícia para a alma. Seguiu com duas afirmações absolutamente categóricas. Que sob a impunidade não se constroi uma democracia e que esta tem um significado para muito além do voto, qual seja, proporcionar uma efetiva igualdade de oportunidades. A primeira referência, obviamente, atingiu a ditadura militar brasileira e a impunidade para os seus torturadores.

Quanto à democracia, lembrou que ela é uma árdua luta em torno de conquistas e que estas jamais podem ser vistas como um regalo, usando a bela palavra espanhola, pois os ataques contra ela são permanentes. Lembrou do clima da guerra fria, da Escola das Américas, do War College e da Ideologia da Segurança Nacional, responsáveis pela guerra permanente contra os povos da América Latina.

Lembrou da especialização dos exércitos na tortura, em seus processos de aprendizagem. Os americanos com a guerra do Vietnã e os franceses na guerra da independência da Argélia, sendo que os franceses foram os inventores dos desaparecimentos, especialmente de crianças. Recordou, ainda, os aprendizados ocorridos ao longo da Guerra Civil Espanhola.
Pereira da Viola propiciou a todos uma carícia para a alma.

Voltou a tocar na questão da impunidade para os torturadores e sobre a necessidade da unidade dos povos na luta pela democracia, alertando para a importância do Brasil neste processo. Alertou também para a nova metodologia dos golpes, onde as intervenções militares já não são mais necessárias. Hoje basta a mídia, aliada com setores de classe média e parlamentares conservadores para que os golpes sejam aplicados. Lembrou que assim ocorreu com os defensores do meio ambiente em Honduras e nas denúncias contra um exército revolucionário paraguaio, para a derrubada do presidente Lugo. A mídia implanta o descrédito dos governantes indesejados pelas elites..

Os alertas mais contundentes vieram em cima das finalidades desta nova onda golpista: a privatização de todas as empresas nacionais e a supressão das históricas conquistas trabalhistas  e dos direitos sociais dos mais necessitados.

Lembrou o caso argentino, em que os conservadores chegaram ao poder pela via democrática, mas que, em apenas quatro meses de governo, já rebaixaram, para abaixo da linha de pobreza, mais de 1,4 milhão de pessoas.

Lembrou que os golpes não começam pelo econômico mas sempre pelo aspecto cultural, pelo desenraizamento das culturas locais, para implantar uma cultura padrão, uniformizada, para sob ela implantar os ditames do livre mercado. E esta uniformidade é que conduz aos totalitarismos.
Toda a serenidade e tranquilidade de um Nobel da Paz.

Lembrou ainda da madre tierra e da generosidade de todos os bens por ela concedidos mas devastados pelas monoculturas. Em locais onde se implantaram as monoculturas não há vida, não há pássaros e, nem sequer, sapos. Falou da urgente necessidade de um novo Contrato Social, em nome da sobrevivência da humanidade. 

Já ao final da fala, após a conclamação pela unidade em torno da não recolonização do continente usou de uma belíssima imagem, lembrando que quando perdemos o rumo em nossa caminhada, devemos fazer o caminho do regresso para lembrar de onde viemos. A conclamação também se fez em torno da multiplicação de agentes na luta pela democracia e pelos direitos iguais para todos, para uma grande caminhada de todos, todos muito juntos.

Eu cá comigo, já na volta para casa, refleti sobre a ausência de vida nos campos das monoculturas. Transportei esta imagem para o campo da monocultura do pensamento, que seriam as enormes fazendas ou latifúndios do cultivo do pensamento único e uniformizado, que até mesmo a escola ajuda a produzir, e mais do que isso, que ela impõe - pela padronização de currículos e avaliações. Me invadiu uma tristeza. Mas lembrei do Nobel convocando para a esperança.E esta mensagem se sobrepôs a minha tristeza.

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