Continuo hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista. O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.
Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país.o vigésimo oitavo intérprete analisado neste livro é Fernando Henrique Cardoso. A resenha é assinada por Leôncio Martins Rodrigues, professor de ciência política da USP e da UNICAMP, sob o título Fernando Henrique Cardoso: a ciência e a política como vocação. Antes vejamos traços biográficos seus, contidos ao final do livro.
"Nasce em 1931, no Rio de Janeiro. Gradua-se em ciências sociais (1952) e doutora-se em ciência política (1961), ambos pela Universidade de São Paulo. Com o golpe militar, exila-se no Chile e na França, e ministra aula na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais, na Universidade do Chile e na Universidade de Paris-Nanterre. Em 1968 retorna ao Brasil e obtém a cátedra de política da USP, da qual é professor emérito. No ano seguinte cria Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP). É um dos fundadores do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) pelo qual foi ministro da Fazenda de Itamar Franco (1992-5); e posteriormente eleito presidente da República por dois mandatos consecutivos (1995-2003). É autor, entre outros, de Capitalismo e escravidão no Brasil meridional (1962) e Dependência e desenvolvimento na América Latina (1969, com Enzo Faletto).
O resenhista, após apresentar dados biográficos e traçar o caminho de FHC para as ciências sociais na Universidade de São Paulo, local também do exercício de suas atividades profissionais mostra as três grandes etapas da vida do teórico e político brasileiro: as de sua carreira acadêmica, a de seu exílio pós-golpe de 1964 e a sua fase política em que chegou a ser senador, ministro de Relações Exteriores e da Fazenda e eleito e reeleito presidente da República.
De sua fase acadêmica destacam-se os livros sobre a temática da questão racial, presente em sua dissertação de mestrado Cor e mobilidade social em Florianópolis, escrita junto com Octávio Ianni, sob a orientação de Florestan Fernandes (1955) e o seu doutoramento, do qual resultou Capitalismo e escravidão no Brasil meridional (1962). Ainda é desse período Empresário industrial e desenvolvimento econômico, a sua livre docência, em livro de 1964.
De sua fase de exílio surge o seu livro mais famoso. Ele exilou-se em Santiago do Chile, sede de alguns organismos da ONU, - CEPAL entre eles -, entrando, dessa forma, em contato com muitos intelectuais de passagem pelo Chile. Foi ali que conheceu Enzo Faletto, com quem escreveu em 1966-7, - Dependência e desenvolvimento na América Latina. Sobre este livro, vejamos o resenhista:
"Trata-se de um ensaio relativamente curto (166 páginas na primeira edição em espanhol) que jogou para o centro do debate sociológico, político e ideológico o tema das vias e possibilidades de desenvolvimento latino-americano. Mais ainda: FHC e Faletto abriram um novo esquema de interpretação capaz de entrosar variáveis econômicas com políticas, quer dizer, com as estruturas de dominação de classes, dos conflitos e das instituições sociopolíticas. Desse modo, por um lado, flexibilizaram o determinismo das análises que partiam das infraestruturas do modo de produção, enquanto, por outro, introduziam as incertezas derivadas dos conflitos das vontades e dos resultados das ações dos homens. Tomaram como variável principal os modos de relacionamento (dependente) dos países latino-americanos com o mercado mundial, ou seja, com as metrópoles; trabalharam com a variável (ou as variáveis) que era determinante e deixaram de lado a multidão de dados que não lhes parecia decisiva". Vejamos ainda, sobre esse livro, causador de muitas polêmicas:
"Após sua publicação, o tema da dependência ganhou espaço nas discussões políticas sob versões mais radicais e esquemáticas das quais se extraía a conclusão que a dependência implicava a impossibilidade de desenvolvimento econômico nacional. Mais pragmático do que ideológico, FHC já tinha observado que o capitalismo não estava estagnado na maior parte da América Latina. A industrialização - no Brasil particularmente - avançava mesmo sob regime militar".
A sua volta ao Brasil ocorre em 1968, mesmo atingido pelo AI-5 em 1969. Com a redemocratização intensifica a sua atividade política e, como vimos em seus dados biográficos, exerce e se elege para vários cargos, chegando em duas oportunidades ao exercício da presidência da República, pelo partido que ajudara a fundas, O PSDB. A partir daí, seus livros são coletâneas de artigos publicados, de observações sobre a política e sobre o exercício do poder. Leôncio Rodrigues assim termina a sua resenha:
"Aprendeu que políticos e intelectuais estão em campos sujeitos a regras de comportamento e de ascensão diferentes. Contudo FHC se define 'basicamente', como um intelectual. A política, segundo ele, teria sido apenas atividade transitória. Aceitemos. Mas então aceitemos também que FHC foi um intelectual com extraordinária capacidade para a política e que não consegue abandonar nenhum desses campos. Depois de deixar a presidência da República, aceitou o cargo de presidente de honra do PSDB e voltou a dar, em 2008, um curso na Universidade de Brown, nos Estados Unidos". E uma observação, um tanto picante. O seu PSDB está naufragando.
Como de hábito, o trabalho anterior sobre Octávio Ianni.
http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/05/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes_20.html
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