sábado, 20 de maio de 2023

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país. 27. Octávio Ianni.

Continuo hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista. O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país.

A vigésima sétima resenha do presente livro é sobre Octávio Ianni. Ela é assinada por Elide Rugai Bastos, professora do Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas, sob o título Octávio Ianni: diversidade e desigualdade. Vejamos inicialmente dados biográficos seus, contidos ao final do livro:

"Nasce em 1926 em Itu, São Paulo. Gradua-se em ciências sociais pela Universidade de São Paulo (1954) e torna-se assistente da cadeira de Sociologia I, na época ocupada por Florestan Fernandes. Defende mestrado (1956), doutorado (1961) e livre-docência (1964) na mesma instituição. Cinco anos depois, é aposentado pelo AI-5 e participa da fundação do CEBRAP. Atua como professor visitante e conferencista em universidades dos Estados Unidos, Europa e América Latina. Em 1977 começa a lecionar na Pontifícia Universidade Católica e, em 1986, na Universidade Estadual de Campinas. É professor emérito da USP e UNICAMP. Assina, entre outros: As metamorfoses do escravo (1962), A formação do Estado populista na América Latina (1975), A ideia de Brasil moderno (1992) e Teorias da globalização (1996). Falece em São Paulo em 2004.

Elide Bastos inicia a sua resenha destacando os campos de trabalho de Ianni: a questão racial, o mundo agrário, Nação e Estado, cultura, planejamento estatal e a globalização. Mas o seu grande tema é o que está contido no título de sua resenha: diversidade e desigualdade. A diversidade ajudava a esconder a desigualdade. Foi introduzido nessa temática por Florestan Fernandes, de quem foi orientando e assistente. Polemizou com Gilberto Freyre, de quem contestou o mito da democracia racial. Crítico do processo da abolição, afirmava a permanência dessa instituição e o impedimento ao acesso aos direitos básicos da cidadania.

Outra de suas marcas é contestação da visão dominante no Brasil de que as desigualdades provinham da questão da classe social, afirmando que o principal motivo da desigualdade brasileira era originária do racismo, da estereotipação do negro. Vejamos a resenhista: "Percebe como o negro é definido a partir de fórmulas estereotipadas em relação a seu aspecto pessoal, ao modo de encarar a vida, à percepção do trabalho, à dedicação profissional, à moralidade, à capacidade intelectual. Em um balanço geral, o negro é apreendido em termos negativos, ou melhor, na comparação entre brancos, mulatos e negros, ao último cabe o índice inferior em termos de valorização".

Esse será o tema dominante em sua formação. Havia uma cultura hierarquizada. Ao negro cabia manter as suas origens e permanecer excluído, ou então assimilar passivamente a cultura branca dominante. A isso chamavam de "integração" na sociedade. Ao negro foi proibido ser o sujeito político de sua própria abolição. Após a abolição não foram fixadas as bases de sua nova socialização, a da sua transição de homem escravizado para homem livre.

Outro tema forte sempre presente é a questão da criminalização do social, sempre vista como uma questão de desordem. Vide, os movimentos sociais. Criticou os projetos de "colonização" da amazônia, pela total desconsideração dos povos indígenas, posseiros e povos da floresta. Tinha também profundas divergências com os pensadores do ISEB. Afirmava ainda que a sociologia permitia, para além do conhecer, também um modo de atuar. Assim, era permitido ao sociólogo, ou ao intelectual, agir não em esquemas rígidos e únicos. Considerava, ainda, as ditaduras como os grandes pesadelos dos povos latino americanos.

Seu último grande tema foi a análise do processo de globalização, no qual a diversidade e a desigualdade se acentuavam ainda mais. Também falava da permanência dos problemas na entrada do século XXI. Vejamos pelas palavras da resenhista: "Mostra que o mundo ingressa no século XXI debatendo-se com a questão racial, com a intolerância religiosa, com a contradição natureza-cultura, com os dilemas do lugar da mulher na sociedade, com as tensões trazidas pela desigualdade social e econômica entre os diferentes países e classes sociais".

Na conclusão de sua resenha Rugai Bastos fala da permanência e da atualidade de Ianni: "A negação à verdadeira participação política, social e aos bens culturais configura fortemente a noção de desigualdade. Em outros termos, a exclusão articula as diferentes esferas da sociedade: a econômica, a social, a política e a cultural. [...] Um segundo ponto diz respeito ao fato de nas crises econômicas, naturalmente com reflexos políticos, desnudarem-se as relações entre diversidade e desigualdade. Nesses momentos aparece, de forma clara, como a liberdade do diverso é comprimida pela destituição e pela exclusão. Em outros termos, as formas culturais que fogem do modelo ocidental homogeneizador são fortemente reprimidas".  Vejamos ainda as palavras finais:

"Haveria segundo o autor, formas de superar o impasse? Afirmando essa possibilidade, segundo ele, caberia às ciências sociais encontrar uma maneira de garantir a interação entre direitos e liberdades. O desafio seria encontrar um modo de organização da sociedade que permitisse aos indivíduos uma liberdade real para que pudessem realizar diferentes concepções de vida, conforme suas aspirações". 

Deste autor já tenho uma resenha de seu livro O colapso do populismo no Brasil.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2020/10/o-colapso-do-populismo-no-brasil.html

E, como de hábito, o trabalho anterior do presente projeto sobre Raymundo Faoro

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/05/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes_19.html

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