terça-feira, 9 de maio de 2023

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país. 17. Guerreiro Ramos.

Continuo hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista. O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.


Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país.

A décima sétima resenha do presente trabalho é sobre Guerreiro Ramos. Ele nos é apresentado por uma resenha de Lúcia Lippi Oliveira, professora e pesquisadora do CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, sob o título - A sociologia de Guerreiro Ramos e seu tempo. Vejamos, inicialmente, alguns dados biográficos seus:

"Nasce em 1915 na cidade de Santo Amaro da Purificação, Bahia. Forma-se em ciências sociais pela Faculdade de Filosofia do Rio de Janeiro (1942) e bacharel pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro (1943). Em 1944, participa do Teatro Experimental do Negro com Abdias do Nascimento. [...] Atua no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) na década de 1950. Elege-se deputado federal suplente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (1963). Publica, dentre outros, Introdução crítica à sociologia brasileira (1957) e Administração e contexto brasileiro (1983). Morre em Los Angeles, Estados Unidos, em 1982".

Antes de mais nada devo dizer que é o meu primeiro contato mais sistemático com o autor. O conhecia apenas como um membro do ISEB. Nas considerações a fazer, começo com o título da resenhista, A sociologia de Guerreiro Ramos e seu tempo. Este título demonstra uma visão toda peculiar que ele tinha da sociologia e dos fins que ela deveria ter dentro da realidade brasileira. Seria, se assim podemos dizer, uma sociologia menos teórica e mais prática. É por esses dados que Lúcia Lippi Oliveira começa a sua análise. A sociologia brasileira deveria contribuir para a formação de uma consciência brasileira. Deveria contribuir com a modernização do Estado brasileiro.

Por isso mesmo, a recepção de sua obra contou com altos e baixos, nos indica a resenha. Ele brigou, discordou e polemizou com a intelectualidade de seu tempo. Por se afastar dos padrões estritamente acadêmicos caiu num certo ostracismo, sendo, inclusive, mais considerado na parte de sua obra referente à administração. A questão racial perpassa toda a sua obra. De Santo Amaro traz a forte presença do catolicismo em sua vida. Em Salvador participa, junto com Abdias Nascimento do Teatro Experimental do Negro (1944), com a finalidade de exaltar os valores da cultura afro. Desse movimento surge a famosa atriz Ruth de Souza.

Em Salvador atua na Secretaria de Educação e ajuda na fundação da Faculdade de Filosofia da Bahia. Depois vem ao Rio de Janeiro para cursar Ciências Sociais na Universidade do Brasil. Ao lhe ser recusada a cátedra de sociologia, ingressa no serviço público, no Departamento de Administração do Setor Público (DASP), para logo depois, trabalhar no Gabinete da Casa Civil, junto com Rômulo Almeida, no novo Governo Vargas. É nesse momento que irá ao encontro de um maior conhecimento da realidade brasileira, defendendo uma "sociologia em mangas de camisa", posicionando-se contra os transplantes culturais, contra a cópia dos estrangeirismos. Continua na sua defesa do negro, como força do povo brasileiro e na defesa de seus valores culturais. A industrialização fará agora, também parte de suas análises. Enuncia sete teses, que fundamentariam a sua sociologia "em mangas de camisa", uma sociologia brasileira. Vejamos parte da resenha;

"Segundo Guerreiro Ramos, a sociologia é consciência, é perspectiva, e seu ensinamento deve permitir a criação do espírito, da atitude sociológica. Tal atitude envolve o compromisso com a nação, compromisso este que está presente em todos os momentos do processo do 'fazer sociológico'. Esse valor que, para os que propugnam uma 'sociologia científica', é exógeno, se apresenta antes e após o 'fazer sociológico', para Guerreiro está presente em todas as etapas. A sociologia engajada de Guerreiro o faz trabalhar com um padrão mais normativo, em que o dever ser deve agir sobre a consciência e sobre a realidade. Daí mencionar sempre os perigos do academicismo e fazer a defesa do engajamento". A resenhista continua:

"Para ele, a ciência estrangeira é subsidiária. Cada produto sociológico (sistema, teoria, método, técnica) tem sentido para o contexto em que foi elaborado. Assim, o equipamento sociológico e a compreensão objetiva de uma sociedade nacional são sempre resultado de um processo histórico". E, mais adiante:

"É com esse arcabouço que vai dedicar-se à 'redução sociológica', título de sua obra maior. A ideia da 'redução sociológica' é apresentada como necessidade de por entre 'parênteses', ou seja, de suspender as análises resultantes da ciência social oficial". A resenhista ainda o mostra envolvido com o ISEB, onde se formulou a perspectiva nacionalista de uma terceira via, fora da visão bi polarizada do mundo. Era o Terceiro Mundo. Foi por este aspecto que eu conhecia o autor. 

Lúcia Oliveira assim termina a sua resenha: "Analisar a trajetória e estudar a obra de Guerreiro Ramos é tratar o campo intelectual e político do Brasil dos anos 1930 aos anos 1980, ou seja, os cinquenta anos que criaram o Brasil contemporâneo".

Como de hábito, o trabalho anterior. Sobre Caio Prado Júnior.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/05/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes_7.html



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