segunda-feira, 22 de maio de 2023

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país. 29. Roberto Schwarz.

Termino hoje mais um trabalho referente aos intérpretes do Brasil. Desta vez o livro referência é Um enigma chamado Brasil - 29 intérpretes e um país. O livro é organizado por André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz. É um lançamento da Companhia das Letras do ano de 2009. A edição que usarei é de 2013. Quem são os personagem trabalhados? Os organizadores respondem: "Os teóricos do racismo científico e seus críticos na Primeira República; modernistas de 1920 e ensaístas clássicos dos anos 1930; a geração pioneira dos cientistas sociais profissionais e seus primeiros discípulos". A abordagem sempre será feita por algum especialista. O livro tem uma frase em epígrafe/advertência. O Brasil não é para principiantes, de Antônio Carlos Jobim.

Um enigma chamado Brasil. 29 intérpretes e um país.

O último intérprete analisado no presente livro, o vigésimo nono, é o sociólogo e crítico literário Roberto Schwarz. Ele é analisado por Leopoldo Weizbort, professor do Departamento de Sociologia da USP, sob o título Roberto Schwarz: entre forma literária e processo social. Vejamos um pouco da biografia desse intérprete.

"Nasce em 1938, em Viena, Áustria. No ano seguinte, sua família muda-se para o Brasil. Gradua-se em ciências sociais pela Universidade de São Paulo (1960), período no qual participa do seminário de leitura das obras de Marx, que ocorre entre 1958 e 1964. Defende mestrado em teoria literária e literatura comparada pela Universidade de Yale (1963) e, no mesmo ano, é nomeado assistente de Antônio Cândido no Departamento de Teoria Literária da USP. Em 1968 exila-se em Paris. Defende doutorado em estudos latino-americanos pela Universidade de Paris III (1976). Leciona teoria literária na Universidade Estadual de Campinas (1978-92). Publica, entre outros, Ao vencedor as batatas (1977), Um mestre na periferia do capitalismo: Machado de Assis (1990) e Duas meninas (1997)".

Foram dois os campos de atuação profissional de Roberto Schwarz. A sociologia e a crítica literária, ou melhor, a junção dos dois, foi o seu trabalho. E o fez examinando a obra de Machado de Assis. Dois foram os seus livros, ambos sobre Machado: Ao vencedor as batatas: forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro (1997) e Um mestre nas periferias do capitalismo: Machado de Assis (1990). Ele uniu os seus estudos  sobre a formação nacional, o desenvolvimento dependente e o capitalismo, somado com o regime de escravidão com a literatura de Machado de Assis.  Vejamos o resenhista, primeiramente sobre Ao vencedor as batatas: 

"A disposição arquitetônica do livro também segue um esquema lucacsiano, segundo o qual convém começar com a exposição da forma geral que se realizaria na forma literária (forma geral essa que decanta o processo social mais amplo), seguida pelo rastreamento de seus antecedentes históricos para, por fim, chegar à forma que se quer investigar. Ao vencedor as batatas segue esse esquema, que lhe serve muito bem: seu primeiro capítulo trata de formular a generalidade capaz de engendrar a forma literária, generalidade essa dada pela sociedade escravista e baseada no favor, mas que não renuncia ao liberalismo no plano das ideias; seu segundo capítulo investiga os antecedentes históricos da forma literária, que desaguarão logo a seguir em Machado de Assis; seu terceiro e último capítulo discute os romance iniciais de Machado, abrindo a perspectiva para o segundo livro. Um mestre na periferia do capitalismo continua desse ponto, da passagem do Machado dos primeiros romances para o romancista maduro. Nesse sentido, limita-se a analisar um único livro da fase plena do escritor, representativo de toda a situação histórica, literária e social". Ainda sobre este mesmo livro:

"A constatação de base, da qual parte, é a contradição entre a ideologia liberal proclamada pela classe dominante e a realidade antiliberal do escravismo. Essa contradição determinaria a vida intelectual, não somente no repertório e nas formas das ideias, mas também em seu corte de classe. Com efeito, na Europa o ideário liberal era ideologia que mascarava a exploração capitalista do trabalho; na periferia do sistema, a forma básica e generalizada de exploração, o trabalho escravo, corria solta, e a ideologia liberal apenas garantia fumos de distinção, de relevo social". E ainda:

"Cabe destacar que, como a forma social é parte do sistema mundial, do qual depende e para o qual contribui, o mesmo se pode dizer com relação a forma literária, a saber: que ela pode revelar muito do que permanece interdito à forma no centro. Em ambos os sentidos, Schwarz repõe a afirmação de Marx, segundo a qual é na colônia que se revela a verdade da metrópole - ou, por outras palavras, o ponto de vista da totalidade que engendra centro e periferia".

Sobre o seu segundo livro: "Neste segundo livro, Schwarz analisa em profundidade um único romance, que abre a perspectiva geral de toda a obra madura: Memórias póstumas de Brás Cubas. E o que consta nesse livro?

"Uma das teses centrais do livro - formulada sob inspiração de Adorno - reza que a dimensão mimética da prosa machadiana madura não diz respeito a conteúdos quaisquer, que ela formula, mas sim ao rigor construtivo da prosa, que mimetiza a vida ideológica e expõe assim estrutura e experiência sociais. Trocando em miúdos, a prosa do romance, em seu andamento volúvel, inconstante e caprichoso, permite a coabitação contínua e sistemática de norma burguesa e seu desrespeito, interesse discricionário e ideologia igualitária, que não se resolvem jamais: nem no romance, nem na realidade, onde continuam até hoje. No registro da prosa, isso significa verossimilhança".

E, as palavras finais do resenhista: "Nessa perspectiva de interpretação do Brasil por Schwarz, construída por meio da refração machadiana, alinha-se aos esforços da história e da sociologia em se pensar a especificidade da nossa formação nacional como um momento estrutural do processo mais amplo de desenvolvimento do capitalismo moderno - nosso atraso moderno. Considerada em paralelo com aqueles esforços, tal interpretação ressalta pela sua articulação brilhante: penetração analítica, inteligência argumentativa e sugestão teórica".

Como de hábito, também neste último post, o trabalho anterior, sobre FHC.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2023/05/um-enigma-chamado-brasil-29-interpretes_21.html


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