Ontem, 31 de março de 2016, me dirigi novamente ao prédio histórico da UFPR. Desta vez foi para ouvir a fala da professora Dra. Márcia Tiburi, autora do livro, entre outros, de Como conversar com um fascista - Reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro. O evento foi promovido pelo Núcleo de Criminologia e Política Criminal, vinculado ao Programa de Pós Graduação em Direito desta universidade. Este programa é hoje dirigido pelo pelo meu ex colega e amigo, o Dr. Luiz Fernando Lopes Pereira. Recentemente eu tinha assistido a magistral Aula Magna, de abertura do ano letivo, deste mesmo curso. Foi um acontecimento notável.
A professora Dra. Márcia Tiburi em sua fala na UFPR, no curso de Direito.
A professora Dra. Márcia Tiburi em sua fala na UFPR, no curso de Direito.
Conhecia a Dra.Márcia como colunista da revista Cult e pelo seu mais recente livro, Como conversar com um fascista, já em 6ª edição e, recentemente, lançado também em Portugal. Depois de devidamente apresentada, ela complementou com uma auto apresentação. Contou de sua demissão da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ao final do ano passado, por haver participado de uma atividade no Senado da República, em favor da descriminalização do aborto. A dra. Márcia é uma conhecida e combativa feminista.
Falou ainda de sua formação. Graduada em filosofia pela PUC/RS e mestrado e doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O tema de seus estudos: Adorno. Como sabemos, Adorno viveu atormentado pelo fascismo na versão nazista, passando longa parte de sua vida em fuga dele e, buscando interpretá-lo. É óbvio que Adorno esteve muito presente na sua fala. A personalidade autoritária, Educação após Auschwitz, Mínima Moralia, Dialética do esclarecimento foram constantemente lembrados.
Sobre a motivação de escrever este livro, fez primeiramente algumas considerações gerais. Apresentou a leitura como um antídoto ao fascismo e considerou que, seria por isso, que somos tão pouco convidados para ler e muito menos ainda, para escrever. Conta que fez uma série de brincadeiras em torno do tema, - machistas, idiotas ou fascistas, como título para o livro, mas que a decisão de escrevê-lo mesmo, ocorreu em uma festa de família, numa noite de natal, quando alguém teceu elogios ao deputado Bolsonaro.
O livro de Márcia Tiburi. O livro surgiu num momento extremamente oportuno.
Disse que o ficou observando. Como ninguém o contestava, ele virou um sacerdote, começou a pregação e promoveu o emudecimento. Aí destilava todo o seu ódio contra os negros, contra as mulheres e contra as pessoas de periferia, contra todos os diferentes. Ou como diz em seu livro, citando o deputado gaúcho Luis Carlos Heize: "quilombolas, índios, gays, lésbicas. Tudo o que não presta" Discursava para disfarçar os seus medos e desfilava todos os seus preconceitos. Aí decidiu escrever. O fascista começa pela recusa ao diálogo, quando a conversa não flui espontaneamente, quando as pessoas se tornam insuportáveis.
Aí a sua conversa fluiu para o diálogo, o objeto de toda a filosofia. Definiu a filosofia como a busca da vida contemplativa e a vida contemplativa ocorre porque as pessoas convivem. Contemplar é o preparo para o diálogo e o verdadeiro saber é o encontro com o outro e este encontro se dá pelo diálogo, o encontro com o outro, com quem eu penso. O inventor do método do diálogo foi, sem dúvida, Platão, embora as muitas besteiras que tenha escrito. Pelo diálogo nos tornamos seres de linguagem e o que assistimos hoje, é o empobrecimento da linguagem, o empobrecimento do diálogo.
Falou também das reações ao seu livro. Disse que está sendo muito xingada, especialmente, por aqueles que não leem e nem estão dispostos a ler o seu livro. Falou ainda do ódio, que não é o pior dos sentimentos humanos, porque ele pode propiciar a dialética e se transformar em amor. Apresentou então, aquele que é efetivamente o pior dos sentimentos humanos, aquele que não permite a dialética, aquele que jamais se poderá transformar em amor, aquele que jamais permitirá qualquer sentimento de generosidade, que é a inveja. A inveja é o oposto da gratidão, ela é totalmente destrutiva. Contou que existem pessoas que vão às livrarias, simplesmente para esconder o seu livro.
Versou depois sobre o desaparecimento do diálogo com o surgimento das novas invenções tecnológicas da sociedade capitalista. Ela formou pessoas vidiotizadas, que transformaram instrumentos meio, em instrumentos fim. Os modernos celulares são partes do corpo humano. Substituíram o coração e, assim, já não existem mais pessoas cordiais. A tecnologização de nossas vidas nos torna impotentes para o diálogo. O cotidiano da vida das pessoas não pode se resumir ao facebook.
Falou ainda de seus livros de filosofia, o Filosofia Comum e Filosofia Prática e com eles foi encerrando a sua fala. Definiu através de vários filósofos que a idiotice ou a burrice é a negação do outro. E da negação do outro nasce todo o ódio fascista, expresso por atitudes cotidianas em nossa cultura como o xingar e o humilhar. E nos fez o grande convite para fugir da idiotice e da burrice pela convivência. O verdadeiro cuidado de si é a busca do bom conviver, pois, nos constituímos, nos construímos como seres humanos, no conviver, na abertura que temos para com o outro. E isso pode ser expresso pela alegria do conviver com repetidos encontros, com muitas conversas, com muitas trocas, com muitas expressões da generosidade humana.
Fez ainda algumas considerações sobre alguns dos capítulos do livro, como a cultura do assédio e a lógica do estupro. E cada vez que entravam os temas feministas, ela se iluminava e falava com maior veemência. Houve ainda a intervenção das debatedoras e novas considerações da Dra. Márcia. A noite terminou com autógrafos. Ganhei o meu, junto com um beijo.
O meu autógrafo, junto com um beijo.
A curiosidade ainda me moveu a pesquisar, hoje pela manhã, sobre a personalidade autoritária trabalhada pelo Adorno. Basicamente as características desta personalidade autoritária são as marcas do fascista, apresentadas pelo Dr. Rubens Casara, com quem a Márcia é casada, na apresentação do livro. Apenas para provocar, listo aqui as nove características traçadas por Adorno em sua pesquisa. 1. Convencionalismo 2. Submissão acrítica. 3. Agressividade autoritária. 4. Destruição e cinismo 5. Poder e rudeza. 6. Superstição e estereotipia. 7. Exteriorização. 8. Projeção. 9. Sexo. Adianto apenas alguma coisa sobre o nono item. O fascista tem uma preocupação exagerada com o sexo como fruto da ansiedade e da repressão. Os outros itens, os deixamos para um próximo post.
Sobre a motivação de escrever este livro, fez primeiramente algumas considerações gerais. Apresentou a leitura como um antídoto ao fascismo e considerou que, seria por isso, que somos tão pouco convidados para ler e muito menos ainda, para escrever. Conta que fez uma série de brincadeiras em torno do tema, - machistas, idiotas ou fascistas, como título para o livro, mas que a decisão de escrevê-lo mesmo, ocorreu em uma festa de família, numa noite de natal, quando alguém teceu elogios ao deputado Bolsonaro.
O livro de Márcia Tiburi. O livro surgiu num momento extremamente oportuno.
Disse que o ficou observando. Como ninguém o contestava, ele virou um sacerdote, começou a pregação e promoveu o emudecimento. Aí destilava todo o seu ódio contra os negros, contra as mulheres e contra as pessoas de periferia, contra todos os diferentes. Ou como diz em seu livro, citando o deputado gaúcho Luis Carlos Heize: "quilombolas, índios, gays, lésbicas. Tudo o que não presta" Discursava para disfarçar os seus medos e desfilava todos os seus preconceitos. Aí decidiu escrever. O fascista começa pela recusa ao diálogo, quando a conversa não flui espontaneamente, quando as pessoas se tornam insuportáveis.
Aí a sua conversa fluiu para o diálogo, o objeto de toda a filosofia. Definiu a filosofia como a busca da vida contemplativa e a vida contemplativa ocorre porque as pessoas convivem. Contemplar é o preparo para o diálogo e o verdadeiro saber é o encontro com o outro e este encontro se dá pelo diálogo, o encontro com o outro, com quem eu penso. O inventor do método do diálogo foi, sem dúvida, Platão, embora as muitas besteiras que tenha escrito. Pelo diálogo nos tornamos seres de linguagem e o que assistimos hoje, é o empobrecimento da linguagem, o empobrecimento do diálogo.
Falou também das reações ao seu livro. Disse que está sendo muito xingada, especialmente, por aqueles que não leem e nem estão dispostos a ler o seu livro. Falou ainda do ódio, que não é o pior dos sentimentos humanos, porque ele pode propiciar a dialética e se transformar em amor. Apresentou então, aquele que é efetivamente o pior dos sentimentos humanos, aquele que não permite a dialética, aquele que jamais se poderá transformar em amor, aquele que jamais permitirá qualquer sentimento de generosidade, que é a inveja. A inveja é o oposto da gratidão, ela é totalmente destrutiva. Contou que existem pessoas que vão às livrarias, simplesmente para esconder o seu livro.
Versou depois sobre o desaparecimento do diálogo com o surgimento das novas invenções tecnológicas da sociedade capitalista. Ela formou pessoas vidiotizadas, que transformaram instrumentos meio, em instrumentos fim. Os modernos celulares são partes do corpo humano. Substituíram o coração e, assim, já não existem mais pessoas cordiais. A tecnologização de nossas vidas nos torna impotentes para o diálogo. O cotidiano da vida das pessoas não pode se resumir ao facebook.
Falou ainda de seus livros de filosofia, o Filosofia Comum e Filosofia Prática e com eles foi encerrando a sua fala. Definiu através de vários filósofos que a idiotice ou a burrice é a negação do outro. E da negação do outro nasce todo o ódio fascista, expresso por atitudes cotidianas em nossa cultura como o xingar e o humilhar. E nos fez o grande convite para fugir da idiotice e da burrice pela convivência. O verdadeiro cuidado de si é a busca do bom conviver, pois, nos constituímos, nos construímos como seres humanos, no conviver, na abertura que temos para com o outro. E isso pode ser expresso pela alegria do conviver com repetidos encontros, com muitas conversas, com muitas trocas, com muitas expressões da generosidade humana.
Fez ainda algumas considerações sobre alguns dos capítulos do livro, como a cultura do assédio e a lógica do estupro. E cada vez que entravam os temas feministas, ela se iluminava e falava com maior veemência. Houve ainda a intervenção das debatedoras e novas considerações da Dra. Márcia. A noite terminou com autógrafos. Ganhei o meu, junto com um beijo.
O meu autógrafo, junto com um beijo.
A curiosidade ainda me moveu a pesquisar, hoje pela manhã, sobre a personalidade autoritária trabalhada pelo Adorno. Basicamente as características desta personalidade autoritária são as marcas do fascista, apresentadas pelo Dr. Rubens Casara, com quem a Márcia é casada, na apresentação do livro. Apenas para provocar, listo aqui as nove características traçadas por Adorno em sua pesquisa. 1. Convencionalismo 2. Submissão acrítica. 3. Agressividade autoritária. 4. Destruição e cinismo 5. Poder e rudeza. 6. Superstição e estereotipia. 7. Exteriorização. 8. Projeção. 9. Sexo. Adianto apenas alguma coisa sobre o nono item. O fascista tem uma preocupação exagerada com o sexo como fruto da ansiedade e da repressão. Os outros itens, os deixamos para um próximo post.
Uau! Já queria lê-lo agora então, depois dessa análise competente, maior é minha expectativa para enredar-me nas teias desse tema tão candente em nossa atualidade. Obrigada Pedro Eloy pela partilha sempre acurada. Bj. ( o meu não vale o da autora, mas tudo bem)
ResponderExcluirOi Sucapoeta. Muito obrigado pelo seu generoso comentário. Como é boa a aproximação com pessoas instigantes como a Márcia. O seu beijo também vale. Ele sempre representa um ato de generosidade.
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