quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Darcy Ribeiro. Sua Formação Universitária.

No post anterior sobre Darcy Ribeiro vimos a literatura e o cinema moldando a sua persona. Hoje vamos ver um pouco de sua formação universitária. Novamente recorremos às suas Confissões para alcançarmos o nosso intento. Isso aconteceu com a sua ida para Belo Horizonte. Sua mãe e ele próprio queriam que o menino se tornasse médico. Darcy particularmente se inspirava em seu tio, o tio Plínio, aquele que o colocou em contato com os livros, o homem mais culto de Montes Claros.

Darcy nos relata como ele chegou em Belo Horizonte: "Ia incompleto e muito mal acabado, sobretudo ingênuo, sem ter a menor noção disso. Era realmente um moção tolo de dezessete anos". Nos confessa que fora totalmente catequizado pelo DIP e que tinha um verdadeiro horror dos comunistas. A literatura católica lhe chegava pela sua mãe, por uma revista pia, Ave Maria. Por ela ficou sabendo que os "comunistas tinham o mau gosto de estuprar freiras".
Mais relatos sobre as leituras e a formação de Darcy Ribeiro, a partir de suas Confissões. 

Assim chegou ao curso de pré médico, do qual ele gostou bastante. Só não gostava da matemática e teve aí a percepção de que ela exerce uma ditadura sobre todo o conjunto da educação, sempre arrogando para si uma superioridade que não possui. Afirma que a maior descoberta deste período foi a de que ele poderia frequentar as aulas dos outros cursos e, muito mais importante do que isso: "Inventei então a universidade dos meus sonhos, que busquei implantar mundo afora".

Nas aulas de filosofia se encantava com os professores que versavam sobre Kant, Schopenhauer ou Freud e mais: "Ali se davam aulas de tudo. Todas nesse diapasão declamatório. Uma maravilha, de que eu fruía contentíssimo, livre da matemática e dos cadáveres". O que ainda lhe faltava, ele buscava na faculdade de direito "melhor, ainda que mais contida". Ali se encantou com aulas de política sobre o governo inglês. Nem poderia ser diferente, pois ali estão os principais fundamentos, tanto da política, quanto do direito. O resto era completado com as aulas de filosofia do direito. Eu creio que já deu para perceber que o curso de medicina não era a sua praia. Trocou depois, fazenda tamanho sesmaria, pelo curso de ciências sociais da Universidade de São Paulo.

Bares e conversas com os amigos também eram espaços formativos importantes. Com o amigo Hélio Pelegrino, católico de confissão e comunhão, discutiu religião e lhe propôs fundar uma religião mais racional. De Hélio recebeu a resposta de que ela já existia e que no Rio de Janeiro existia até uma igreja. Referia-se ao positivismo. E lá se foi Darcy para o Rio de Janeiro, conhecer esta religião. Se decepcionou com o retrato de Clotilde de Vaud, a grande paixão de Augusto Comte, substituindo a imagem de Nossa Senhora. Gostou, no entanto, dos muitíssimos santos representados pelas estátuas de Aristóteles, Platão, Newton e Descartes, entre outros.

A sua vida seguia uma rotina. De dia as aulas de sua devoção e não as da obrigação. De noite, os debates nos bares. Ali aprendeu que Getúlio era um horrível ditador e soube da luta da democracia contra os países do eixo. E, de novo, a beleza da literatura, descobrindo agora: "a grandeza de Romain Rolland e a beleza dos romances de Thomas Mann, Faulkner, Pirandello, que nos desprovincializavam. A nova literatura nacional de Jorge Amado, José Lins e Graciliano Ramos me encantou. Passei meses com eles nos cacauais da Bahia, nos engenhos decadentes e no nordeste seco".

Os entornos da política também ajudaram, pois ela fervilhava. Belo Horizonte era governada por JK. Niemeyer começava a expor o seu gênio na Pampulha e o governador Benedito Valadares lançava a pedra fundamental da UFMG. Darcy afirma que ele era muito requisitado: "Passei a ser disputado pelos integralistas e pelos comunistas". Os integralistas andavam mais equipados, sempre com as mãos cheias de livros novedosos, nacionalistas e anti-imperialistas enquanto que os comunistas não tinham esta literatura. Só tinham áridas teses. Darcy encontrou o comunismo na obra de Jorge Amado, O Cavaleiro da Esperança, retratando a vida de Prestes. Também foi alargando seus horizontes com mais e mais leituras: "Textos sobre Heckell, Spencer, Marx, Freud, Nietzsche, Schopenhauer me empolgaram e me deram um novo discurso".

Termino este post com uma revelação que considero bastante importante. Vejamos o relato de Darcy: "Ainda tenho um volumezinho histórico para mim, A Origem da família, da propriedade privada e do Estado, de Friedrich Engels, que eu tentei reescrever quarenta anos depois com o meu O Processo Civilizatório. Darcy entrou depois numa célula comunista. Também considero interessante o seu  depoimento a respeito de pessoas que seguem ideologias com absolta fidelidade, pelas quais manifesta o seu maior respeito: "Meus caminhos foram outros, afortunadamente, mas ainda me lavo naquelas águas. Não sou comunista, nem marxista sou, mas sou discípulo, herdeiro de Marx, que vejo espantado como denominador comum de todas as ciências do homem, que é o que explica a atualidade de Marx".

Bem, quem quiser rastrear os caminhos percorridos para a formação de gênios, está aqui mais um, o de Darcy Ribeiro. Já mostramos as leituras de Niemeyer e muitas outras ainda serão mostradas. Quando eu vejo estas coisas, eu vou descobrindo cada vez mais a precariedade da minha formação. Mas isso também tem uma compensação. Com muitas dessas leituras eu vou preenchendo o meu tempo nos dias de hoje.







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