segunda-feira, 18 de julho de 2022

Um banquete no trópico. 28. Minha formação. Joaquim Nabuco.

Este é o vigésimo oitavo trabalho do presente projeto.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2022/03/introducao-ao-brasil-um-banquete-no.html

Trata-se da resenha de Maria Alice Rezende de Carvalho, historiadora, socióloga e professora do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), do livro Minha formação de Joaquim Nabuco. A resenha encontra-se em  Introdução ao Brasil - Um banquete no trópico de Joaquim Nabuco, livro organizado por Lourenço Dantas Mota, volume II, nas páginas 219 a 236. É o terceiro comparecimento de Joaquim Nabuco na seleção desses livros de Introdução ao Brasil. Isso, por si só, mostra a sua importância. O livro foi publicado no ano de 1900. Ele se constitui de 26 capítulos, que anteriormente já haviam sido artigos de jornais, escritos ao longo dos anos 1893 a 1899.

No volume II, a resenha de Minha formação.

O livro reflete as decepções do autor com a incipiente República, decepções que o afastaram do cenário político para um retiro em Petrópolis, onde escreveu essas suas memórias. Elas são um chamamento ao país, para um estudo sobre o seu passado e uma projeção para o seu futuro. Como veremos, era um monarquista convicto e a sua decepção com a República tinha causas específicas. A militarização e o caráter violento e personalista que a afetou, além do não cumprimento das reformas que ele havia proposto em O Abolicionismo, para acabar, não só com a escravidão, mas também com a sua obra.

No prefácio ele mesmo apresenta o teor do livro; "havendo nele ideias, modos de ver, estados de espírito de cada um desses anos" (1893 a 1899). Inicialmente não teve grande repercussão, mas ele se afirmou posteriormente. A resenhista qualifica o livro como um livro de persuasão. Ele tenta persuadir a elite brasileira da necessidade da continuidade das reformas do Segundo Reinado e, assim evitar o perigo dos caminhos revolucionários. Temia a República por considerá-la impregnada do racionalismo jacobino dos franceses. Queria evitar uma condução afoita do país. O autor, logo nos primeiros capítulos, procura mostrar a origem de suas convicções. Considero essa busca algo fascinante quando se estuda a questão da formação.

Ele confessa que na juventude vacilou. Deixou-se encantar por autores republicanos franceses e pelos princípios da Revolução. Era ela que iluminava o mundo. Mas este é o momento em que volta os seus estudos para a monarquia inglesa. Ela representava uma garantia para a democracia sem os perigos da Revolução. Por óbvio, uma monarquia constitucional, uma adaptação da política aos ditames do mundo moderno. O seu espírito reformista foi uma herança recebida de seu pai, influente político do Segundo Reinado. Nota-se em sua formação, uma verdadeira anglofilia. Segundo ele, foi a monarquia inglesa que melhor se adaptou na incorporação dos princípios democráticos do mundo liberal. Superior, portanto, aos feitos dos franceses e dos Estados Unidos. A firmeza de sua convicção monarquista lhe veio através do pensador inglês, Bagehot (1826-1877 - estudioso das relações entre o Parlamento e a Monarquia), discípulo de Montesquieu. Vejam a força da influência das leituras. O seu espírito reformista almejava uma sociedade não hierarquizada, não cristalizada em estamentos, regida pelo equilíbrio provocado pela prosperidade que seria gerada pela execução dos princípios liberais.

Muito cedo conheceu o mundo. (o seu programa "Ciência sem fronteiras"). O peso da sapientia mundi caiu sobre ele. Vivenciou por dentro os princípios da cultura ocidental. Ele assim relata essa experiência: "Em 1873 [...] a minha ambição de conhecer homens célebres de toda ordem era sem limites; eu tê-los-ia ido procurar ao fim do mundo. Do mesmo modo com os lugares. O que eu queria ver eram todas as vistas do globo, tudo o que tem arrancado um grito de admiração a um viajante inteligente. Nessa qualidade de câmara fotográfica, só lastimava não ter o dom da ubiquidade". Esses anos foram descritos como anos de muito "prazer, da embriaguez do viver, da curiosidade do mundo". Assim ele consolidou uma visão aristocrática da vida, e o espírito revolucionário se esvaiu por completo. Na Itália entrou em contato com o senso estético e na França com as letras, com o convívio social e a boemia. O cosmopolitismo europeu lhe firmara as crenças liberais e a convicção de que a literatura e a política caminhavam juntas. Também lhe marcou a sua identidade de um intelectual do mundo periférico.

As viagens faziam parte de uma tradição familiar. No velho mundo buscou as "reminiscências da trajetória humana" e dividiu a sua imaginação: "de um lado do mar, sente-se a ausência do mundo; do outro, a ausência do país. O sentimento em nós é brasileiro, a imaginação europeia". Para ele: "as paisagens do Novo Mundo, a floresta amazônica ou os pampas argentinos, não valem um trecho da Via Appia, uma volta na estrada de Salerno a Amalfi, um pedaço de cais do Sena, à sombra do velho Louvre". Um viver como imaginação, na busca da integração entre o regional e o universal. E um grande não ao nativismo romântico do Segundo Reinado (José de Alencar).

Essa é a trajetória de formação do grande intelectual, intelectualidade formada no convívio com os mais famosos nomes do mundo cultural e a vivência em cidades como Paris, Londres e Nova York. A sua preferência é explicitamente manifestada em favor de Londres, por seu apreço à liberdade e pela ordem. Dos Estados Unidos ele nos traz duas interessantes constatações. A primeira é sobre o excesso de preocupação com o mundo material, constatação que ele atenua em razão de ainda viverem na fase de sua juventude. A segunda, diz razão à liberdade individual, totalmente voltada ao business. Também criticou o tratamento dado a seus vizinhos México e Cuba.

A parte final do livro é destinada ás suas convicções religiosas e às memórias de sua infância no engenho Massangana (Cabo de Santo Agostinho). Ali se formaram suas convicções morais e o seu repúdio às relações escravistas. Vejamos a descrição de uma cena de sua infância: "Eu estava uma tarde sentado no patamar da escada exterior da casa, quando vejo precipitar-se para mim um jovem negro desconhecido, de cerca de dezoito anos, o qual se abraça a meus pés, suplicando-me pelo amor de Deus que o fizesse comprar por minha madrinha para me servir. Ele vinha das vizinhanças, procurando mudar de senhor, porque o dele, dizia-me, o castigava, e ele tinha fugido com risco de vida... Foi esse o traço inesperado que me descobriu a natureza da instituição com a qual eu vivera até então familiarmente, sem suspeitar a dor que ela ocultava".

Essa foi a sua infância. Foi vivida entre a beleza da vida no engenho, junto à indignidade da escravidão. A indignação lhe veio primeiramente pelo sentimento, depois pela razão. Adquiriu, conforme diz, uma dívida contraída em menino. Em 1884 volta a se eleger deputado, sendo deputado de uma causa só, a causa da abolição. Era o suficiente. A abolição foi o grande tema de sua vida e de O abolicionismo, o seu grande livro. Ele formou a quarta geração de uma família dedicada à política. O seu grande legado foi o de implantar aqui, o espírito pacífico das reformas sociais oriundas da monarquia inglesa e não as do espírito revolucionário jacobino dos franceses. Creio que a principal questão, a do Porquê ele ser monarquista e reformista está bem detalhada. E, aqui, até hoje, apenas reformas conservadoras no interesse de uma elite, A elite do atraso, como nos mostra Jessé de Souza.. Deixo aqui dois links. O primeiro, da resenha de O abolicionismo

 http://www.blogdopedroeloi.com.br/2022/05/um-banquete-no-tropico-26-o.html 

O segundo, como de hábito, a última resenha publicada - História da literatura brasileira de Sílvio Romero. http://www.blogdopedroeloi.com.br/2022/05/um-banquete-no-tropico-27-historia-da.html

Em tempo, um terceiro link, que são as memórias de sua filha Carolina, Oito décadas. Vale muito ver.

http://www.blogdopedroeloi.com.br/2018/02/8-decadas-carolina-nabuco.html


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